¨A Síndrome de Gilles de La Tourette (ST) é uma doença multifactorial do neurodesenvolvimento, com início na infância, que foi descrita no século XIX, em França, por Georges Albert Édouard Brutus Gilles de la Tourette (1). Trata-se de uma doença neurológica não degenerativa, mas potencialmente incapacitante, capaz de gerar grave disfunção psicossocial e física, nomeadamente devido aos tiques, estando frequentemente associada a uma diversidade de comorbilidades, cujas consequências se adicionam e frequentemente sobrepõem às dos tiques. A ST ocorre em todo o mundo, em todas as raças e etnias, em ambos os sexos e tanto em crianças como em adultos. Parece ser 50% menos prevalente em afro-americanos e em populações africanas sub-saarianas, em comparação com caucasianos. A prevalência nos indivíduos do sexo masculino é três a quatro vezes maior do que no sexo feminino. A ST pode apresentar-se apenas como uma doença do movimento ou como uma associação complexa de disfunção motora e neurocomportamental. A clínica caracteriza-se por um conjunto variado de sintomas, entre os quais se destacam os tiques – movimentos (tiques motores) ou sons (tiques fónicos ou vocais) breves, estereotipados, não rítmicos, que surgem de forma abrupta e recorrente, geralmente precedidos por uma sensação premonitória (sensação de ansiedade ou mal-estar crescente) que alivia após a sua execução  A ST é caracterizado por fenômenos compulsivos, que, muitas vezes, resultam em uma série repentina de múltiplos tiques motores e um ou mais tiques vocais, durante pelo menos um ano, tendo início antes dos 18 anos de idade. Estes tiques podem ser classificados como motores e vocais, subdividindo-se, ainda, em simples e complexos. Geralmente, pacientes com ST apresentam, inicialmente, tiques simples, evoluindo para os mais complexos; entretanto, o quadro clínico pode variar de paciente para paciente. Os tiques motores classificam-se de acordo com o grupamento muscular envolvido. Os tiques motores simples caracterizam-se por movimentos abruptos, repetidos e sem propósito, envolvendo contrações de grupos musculares funcionalmente relacionados (por exemplo, piscar os olhos e movimentos de torção de nariz e boca). Os tiques motores complexos são mais lentos, envolvem grupos musculares não relacionados funcionalmente e parecem propositais. Os tiques motores complexos incluem imitação de gestos realizados por outrem, sejam eles comuns (ecocinese) ou obscenos (ecopraxia) e a realização de gestos obscenos (copropraxia). São freqüentemente observados compulsões e gestos balizados, simétricos ou mesmo movimentos violentos com arremesso de objetos. o diagnóstico da ST é realizado através da presença de sinais e sintomas característicos e pela história de surgimento desses sintomas. Encontram-se publicados vários esquemas de classificação e critérios de diagnóstico para SGT, incluindo os do Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais, 4ª edição texto revisto (DSM-IV-TR) (18) e do Tourette Syndrome Classification Group (TSCG). Não existe, atualmente, nenhum teste laboratorial específico que confirme o diagnóstico da ST. Contudo, exames complementares (EEG, tomografia ou análises sangüíneas) podem ser úteis no diagnóstico diferencial da ST, contribuindo para a exclusão de outros distúrbios que possuem sintomas semelhantes. Uma vez diagnosticada a ST em um indivíduo, aspectos diretamente relacionados aos sintomas, como a localização, freqüência, intensidade, complexidade e interferência na vida diária dos pacientes, devem ser cuidadosamente avaliados antes de se iniciar qualquer conduta terapêutica. O diagnóstico e tratamento precoces são essenciais, a fim de reduzir ou evitar possíveis conseqüências psicológicas para o paciente. A escolha do tipo de tratamento deve ser apropriada para cada portador da ST, podendo incluir abordagens farmacológica e a psicológica. Até à data, não existe cura para a ST, o tratamento é estritamente sintomático e muitas vezes desnecessário nas formas leves da doença. Para as formas que provoquem repercussão significativa na vida do doente é possível planificar terapêuticas educacionais e comportamentais, intervenções farmacológicas e, em casos raros e seleccionados, tratamento neurocirúrgico através de estimulação cerebral profunda (ECP), que se encontra em fase de investigação e desenvolvimento, com resultados promissores, mas os dados actualmente disponíveis são de interpretação complexa. De notar que a intrincada apresentação de disfunção motora, psiquiátrica e psicossocial aconselha uma abordagem multidisciplinar abrangente.¨

 

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by Dr Paulo Fernando Leite

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